Nosso Ano Novo Chinês na China
Texto: Mônica Morás Fotos: Eduardo Viero e Mônica Morás
Uma parte da nossa viagem foi planejada para que estivéssemos no país durante algum festival local importante. Foi o caso do Ano Novo Chinês ou Ano Novo Lunar! Além do nosso amigo Alan ser chinês, ele mora próximo de toda sua família em Yantai, no norte do país, e foi pra lá que nós fomos comemorar o ano do carneiro.
Uma semana antes do Ano Novo toda a China já estava começando a parar. Feiras de rua com frutos do mar congelados aumentaram repentinamente, aumentou o número de pessoas nos shoppings para comprar roupas novas da cor tradicional vermelha, as lavagens de carros e cabelereiros ficaram com lista de espera, voos e trens lotados com as pessoas voltando para suas cidades natais e muitos restaurantes e barraquinhas de rua fecharam.
Todos os chineses passam o ano novo com sua família, e não importa quão longa seja a viagem, eles sempre voltam para casa. Pessoas atravessam o país nessa época! E cada parte da China tem uma forma de comemoração.
Na noite de ano novo fomos para a casa do Alan passar com a família da mãe dele perto do mar. Nessa noite é tradição comer dumplins, mas não apenas isso, existe um ritual na preparação deles. O recheio e a massa são preparados ainda de tarde. A noite, quando eles já estão fechados e a água está quente para cozinhá-los, os homens da casa soltam fogos de artifício e quando as mulheres da casa escutam, elas começam a colocar as centenas dumplins na água para cozinhar. Como esse é o prato-principal, esse ritual traz boa sorte. Além disso no recheio é misturado pepinos do mar picadinhos para que traga riqueza e alguns dumplins tem uma amêndoa doce para que os sortudos que pegarem terem um ano muito bom (eu peguei um e o Eduardo, dois) e alguns têm moedas, o que significa que o ano vai ser bastante próspero nos negócios.
A mesa precisa ser bem farta de comida, para que todos entrem o ano com fartura e que ele assim continue. Muitas pessoas humildes economizam dinheiro para que possam oferecer para a família a primeira refeição do ano bastante farta, mesmo que isso signifique ter apenas um camarão por pessoa, por exemplo. Já pepinos do mar são sinal de riqueza e presentear, ganhar e/ou comer significa muito mais riqueza ainda.
Comemos muito, vários tipos de pratos que eu não faço ideia do nome, mas todos deliciosos. Naquela noite todos os canais de televisão estavam transmitindo programações do tipo “show da virada”, porque é tradição a família toda se reunir e assistir esses programas. E exatamente a meia noite começaram as queimas de fogos que durariam por 10 dias incessantes, independente do horário.
No primeiro dia do ano é tradição ir nas casas das pessoas antes mesmo do sol nascer para desejar feliz ano novo. Muitas pessoas sequer dormem esperando esse momento, e as casas já ficam com as portas abertas para que as pessoas possam entrar e cumprimentar os vizinhos falando algo como “gô níe ráu” (não sei como se escreve) ou feliz ano novo, em tradução. Não fizemos isso, porque a família perdeu um ente querido, e isso impossibilita que se vá na casa das pessoas durante três anos para não levar má sorte.
Durante a noite a queima de fogos continua, parece que se está no meio de uma guerra. E isso acontece o dia todo, a noite toda, sem exageros. Acordávamos várias vezes assustados e no quarto dia já estávamos cansados de tanto barulho durante dia e noite. As ruas ficam tomadas de fogos estourados vermelhos.
No primeiro dia do ano passamos com a família do pai do Alan numa ilha/vila de pescadores experimentando mais uma vez uma mesa farta com comidas totalmente diferentes o dia anterior e super deliciosas. Comemos muito de novo! E essas refeições se repetiram dia após dias.
No quarto dia de ano novo é quando as pessoas vão para a rua, vão rezar no templo, é quando acontecem apresentações em parques (no norte não tem dragão) e a vida começa a voltar ao normal. Antes disso eles aproveitam para estarem juntos em casa o tempo todo. Nós também fomos no parque ver as apresentações típicas de ano novo, fomos no templo fazer nossas orações e ainda ganhamos cada um de nós um amuleto da fortuna.
Oficialmente o feriado dura 10 dias e nós passamos 6 dias com a família antes de deixar o país. Foi muito especial e marcante. Eles mantêm uma tradição de séculos, rituais que nós já perdemos, valorizam a união e a data não se tornou algo comercial.
Todos os estrangeiros aproveitam essa época para viajar, porque tudo fica fechado. Nós fomos acolhidos por uma autêntica família que nos mostrou a importância de estar junto, de compartilhar, de comemorar e desejar que todos naquele meio tenham um ano próspero, porque se a família está bem, todos estão bem.